Estava pensando em como iniciar este artigo...E me veio uma lembrança de quando eu era menina, no interior do Rio Grande do Sul.
Certa vez, no Natal, fui à casa de uma amiguinha e vi diversos presentes. Cada qual mais lindo. Havia caixas ainda fechadas nas prateleiras do quarto e perguntei se havia ganhado todos naquele ano. (Imagina, na minha cabeça, um Natal com diversos brinquedos de uma só vez! Eram fascinantes tantas e tantas caixas.)
Mas, descobri que os brinquedos eram feito bibelôs...Não eram para brincar, conforme eu supunha. Ganhava e ficavam na estante...Um mimo guardado e empoeirado.
Voltei pra casa e peguei uma corda que meu pai fez, da carroça, e fiquei pulando. Claro que eu ganhava outros brinquedos...Mas, podia brincar com eles. E, se me perguntarem, gosto mais e ainda tenho a Marisa, feita de espuma cortada por meu pai e roupas feitas pela minha mãe. Aprendi, com a minha mãe a pular de braços cruzados, com um pé só, com a ponta dos pés e com os calcanhares...A pegar, com meu pai, tijolinho quebrado e raspar no chão ou costurar saquinhos e enchê-los como arroz do engenho, para fazer "cinco marias"...
A educação de hoje, em muitas famílias, ainda leva o peso do "muito"... Muito na mesa, muito no guarda-roupas...Muitos sentimentos travados e transformados em comprar e comprar.
Não é à toa que as crianças não querem mais os cadernos quase cheios de folhas em branco do ano passado...Não querem mais guardar os lápis de cor, porque ganharão caixas novas... Fora a cultura que se instaura em pichar a camiseta da escola com assinaturas dos colegas, assim, o vestuário, obrigatoriamente, ganha um lugar de coisa usada e não aproveitada.
Apostilas e livros "consumíveis" e, no ar da graça, muitos pais compram o mesmo livro paradidático que já têm na estante de casa ou com o primo que cursou a série atual dos filhos, sem ao menos consultarem o "acervo".
Um disparate, a meu ver, de ideias mal construídas em casa.
Já presenciei casos de o aluno precisar do módulo do bimestre anterior e a mãe já tê-lo jogado fora, porque se tratava de um conteúdo já visto em testes e provas. Não são acumulativos, segundo alguns. Muitos pais compram o material pra si, os brinquedos para si, e de quebra, um futuro decidido para si, na escolha da escola, da roupa, do brinquedo e do curso e da empregabilidade "garantida".
E nessa fragmentação de coisas e saberes, os pais gastam verdadeiras fortunas na educação também fragmentada dos seus filhos. E reclamam sem sequer notar que estão gerando mais do que o consumo exacerbado nos pequenos; que estão gerando adultos que descartam coisas e emoções, no cartão de crédito.
Final de Ano, hora de rever o que pode ser utilizado durante o próximo ano... Roupas não usadas devem ser revisadas e doadas, material escolar avaliado e organizado. Assim, você, pai ou mãe, ajusta seu orçamento para o que realmente é necessário e ensina seu filho que "mais" não indica "qualidade de vida", que "ter" não é "ser" e "estar"... Por conseguinte, ajusta a educação consumista para uma educação de consciência coletiva, humana e ecológica.
Dentre tantos outros fatores, a falta de autoestima, muitas vezes, está atrelada ao não ter o corpo igual ao do outro, a não ter o caderno igual ao do outro, a não ter a explicação em casa de que podemos ser felizes com os resultados que obtivermos e não pela figurinha grudada na capa do caderno caro.
O bullying, muitas vezes, está atrelado à falta de empatia e à crença de que o diferente é desigual... Os casos de auto mutilação estão, muitas vezes, atrelados ao bullying e à falta de autoestima...Então, ficar comprando a ideia de que "ter" está atrelado a "ser", é ser responsável pelo que não gostaria de ver negativamente na vida do seu filho.
Hora de refletir e perceber que o guarda-roupas está cheio já; e que a escola é lugar de aperfeiçoamento e desenvolvimento pessoal e não um desfile de mochilas e cadernos que só faltam falar, enquanto as crianças se calam.
Grata pela leitura,
Nadia Rockenback
05/01/2018
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